Sábado, 26 de Agosto de 2006

Discurso do Orador, Cristóvam, na nossa Formatura:

Queridos pais

 

Autoridades presentes Senhores professores Colegas, senhoras e senhores.

 

            Não poderíamos deixar de dirigir nossas primeiras saudações a todos os que possibilitaram este dia, e em particular nossos pais.

Não vamos a estes dizer muito obrigado, porque isso pouco significa, mas vocês sabem bem o que sentimos, e se há algo que realmente nos alegra hoje é sabermos que vocês estão felizes, e por nossa causa.

            Outros merecem também nossa gratidão por tudo isto, desde nossas primeiras professoras, até todo esse povo brasileiro, que com seus esforços mantêm nossas escolas.

Gratidão a esse mundo incrível de analfabetos que, por todo esse Brasil, com o suor de seus rostos e os calos de suas mãos, constroem e mantêm as escolas onde estudamos, onde nem eles nem seus filhos poderão entrar.

            Se aos nossos pais dedicamos esta solenidade, com vocês assumimos um compromisso.

O compromisso de que o suor de seus rostos não serviu apenas para molhar os tijolos que sustentam nossas escolas, mas também para moldar a consciência dos engenheiros que de lá saem.

Compromisso que, no entanto sabemos, muito vai exigir de nós, pois na verdade a nossa universidade não prepara homens par a tarefa de solucionar os problemas do nosso homem.

            Sabemos que esta deveria ser a finalidade da universidade, mas não acreditamos que, na forma como está estruturada, conseguirá atingi-la.

A universidade deve ser o local onde gerações diferentes se encontram, se completam e, "ligadas à realidade que as envolve, estudam e lutam preparando quadros que amanhã vão, dentro dessa realidade, corrigir suas falhas e promover suas conquistas.E essa realidade, no nosso caso, é uma realidade de fome, de miséria, de exploração e de ignorância. É em um mundo assim que vamos trabalhar, então para esse mundo a universidade deve estar voltada.

            Para isso, é necessário que a universidade seja um recinto aberto, dinâmico, no qual o mundo exterior, para o qual ela deve existir, lhe diga o que fazer para melhorar.

            Um debate contínuo, uma troca de idéias que processe um fluxo ilimitado de conceitos novos sobre os velhos.

Uma universidade onde aprendamos não apenas a ser médicos, engenheiros ou sociólogos, mas acima de tudo homens, cidadãos brasileiros, cônscios de suas responsabilidades e dos problemas que têm por obrigação enfrentar.

E se o homem é por excelência um ser social, não se admite que em universidades tenhamos cursos voltados muito mais para nós do que para a sociedade. A universidade deve ser eminentemente social, tanto nas inter-relações das diversas escolas, como também na própria visão das matérias.

Mas isso acarretaria uma tomada de consciência profunda em toda a juventude universitária, e poria em sério risco toda a estrutura injusta da sociedade brasileira.

E a muitas e influentes pessoas, não é preciso que se diga, não interessa essa tomada de consciência, e fazem por isso da universidade um local onde velhos donos da verdade ganham para ensinar a uns poucos bons meninos, nós, alguns macetes que lhes facilitem, amanhã, ganharem dinheiro.

            Quantos de nós estamos hoje pensando no que podem fazer pela sociedade brasileira?

            E quantos pensando no que pode a sociedade fazer para eles, ou qual a sociedade que pode pagar melhor para si.

Essa foi a transformação que a universidade sofreu, de homens capazes passou a formar agiotas do conhecimento, pessoas que economizam conhecimento, para amanhã cobrar em dinheiro por ele.

            Em resumo, transformaram nossas universidades em prostíbulos, onde ficam os jovens à espera de quem lhes pague mais, sem interessar o que se lhes peça para fazer.

O próprio conceito de vocação perde o sentido, pois a escolha de uma profissão é dirigida quase exclusivamente pelo fator econômico. Quantas vocações artísticas e científicas vivem frustradas dentro da Escola de Engenharia, apenas porque é uma maneira certa de um salário razoável.

Isso tudo não é coisa de um 10 de abril para cá. Sempre foi assim.

A diferença é que hoje, além de corromperem com uma organização social que nos condiciona, usam critérios de força para baixar aqueles que não se corrompem.

            É preciso que se diga que, da nossa turma inicial, três colegas aqui não estão, por terem tido a qualidade de pensar e a coragem de afirmá-lo.

            Professores do gabarito indiscutível do nosso paraninfo são aposentados por que também pensam e agem segundo o seu pensamento, e não o dos outros.

E enquanto isso acontece, alguns professores que lá ficam em lugar de estudarem - do que tanto precisam - dedicam-se muito amiúde a formar comissões de inquérito para apurar quem escreveu panfletos, criticou diretor ou não se comportou direito.

            São James Bonds pequenos, mal-vestidos, enrolados, que nem ao menos conseguem descobrir coisa alguma.

            Se nossa congregação quer contribuir para a liberdade da escola, que forme uma comissão de inquérito para apurar de onde partem essas outras. Mas não é a primeira vez que isso acontece.

Os inconfidentes foram presos e mortos.

Mas a independência veio.

Os primeiros republicanos perseguidos pelo Império.

E o Império caiu.

O próprio Cristo e os primeiros cristãos foram crucificados, queimados.

Os cesáreos morreram, o cristianismo é uma força.

Recentemente, Demócrito foi assassinado.

Mas a ditadura que o matou foi abaixo.

Hoje seu nome prevê nome de rua.

Será que é ser visionário prever um dia ruas com os nomes dos colegas Ivan e Jonas, mortos no dia 10 de abril?

Se os Senhores Generais que hoje governam o país ouvissem um conselho nosso, lhes diríamos que colocassem de lado, por algum tempo, aqueles livrinhos onde aprendem a dar continências garbosas e estudassem um pouco mais de história, para sentirem que é fácil prender um jovem por vários anos, mas é impossível calar toda a juventude, por algumas semanas que sejam.

Cremos que dentro desse mesmo objetivo, e com outras palavras, podemos dizer que o engenheiro deve valorizar sua profissão colocando nela o homem como meta, como objeto, mas acima de tudo como sujeito de suas decisões. A técnica deve ficar subjugada a interesses políticos. E quando dizemos políticos, dizemos aspirações populares, e não politiquismos que promovem eleições farsantes.

            Não se pode fazer da técnica a dona do homem, como hoje o Ministério do Planejamento tenta fazer.

O que significa - meus senhores - dizer que um país é rico, que tem saldo em Nova York, quando o nosso camponês faz greve para que seu salário de 50 mil cruzeiros mensais seja pago, porque nunca foi.

            Não se pode desejar, meus senhores, que um país rico caminhe por cima dos estômagos famintos de um povo pobre, nos braços caquéticos de crianças subnutridas.

É preciso que se acabe com essa riqueza de números em papel, feita para ser apresentada na TV e criar uma riqueza que seja vista nas ruas, de um povo vulto, saciado, vivendo de maneira justa.

            Nossa responsabilidade é com este povo. Fazer com que as Universidades se abram, que o trabalho seja justo e para todos.

O que nos espera, porém, sabemos, é uma estrutura podre, mas capaz de nos corromper totalmente. Capaz de prostituir nossa técnica, fazendo-a instrumento de interesses mesquinhos e contrários a nossa consciência, apenas pelo oferecimento de cruzeiros ou dólares, o que é muito comum hoje.

Contra isso temos de lutar e não podemos vencer com um rearmamento moral individual, mas sim com uma reformulação completa de todos os valores que nossa sociedade tem.

            Para isso é fundamental que, como disse Dom Helder ontem, na formatura de Química, que o técnico esteja engajado dentro do processo social.

            No entanto, nós discordamos de Dom Helder quando ele frisa que "apesar disso, nós não somos subversivos", pois ele é subversivo.

            E eu sou e nós todos somos, se consideramos esta organização social errada e procuramos modificá-la.

E queremos acrescentar a Dom Helder que, em particular para um engenheiro, sua verdadeira função, dentro deste processo social, é a de transformar para construir, nessa transformação e construção, o instrumento e o fim é o próprio homem, que como ser social exige antes e paralelamente a sua transformação, e de toda a sociedade.

E se para levar avante essas transformações necessárias, se fizer explorar minas, nós as exploraremos, construir casas, instalar indústrias e energia elétrica, nós o faremos também. Se mais que isso, porém necessário se fizer, como nós cremos se fará, uma participação ativa em todo o processo social e da forma que a luta o exigir, fiquem certos que nós não fugiremos e lutaremos também.

 

 

publicado por Fernando Gusmão às 21:41
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